Opinión

Doutrina Estrada e nacionalismos

A Doutrina Estrada é um velho princípio utilizado no domínio das relações internacionais e inspirado na doutrina formulada pelo Ministro dos Negócios Estrangeiros mexicano, Genaro Estrada, na década de 1930. Esta consiste em reconhecer a autodeterminação dos povos, que não é legítimo intervir nos assuntos de outras nações e que as relações internacionais são entre povos e não entre governos, pelo que a forma de governo que adoptam deve ser irrelevante. Por outro lado, é inaceitável que outros povos tentem intervir em assuntos internos que só nos afetam a nós. É esta uma doutrina de paz e de respeito mútuo. 
Isto vem a conto a respeito da atitude que algum partido nacionalista de fora da Galiza adoptara em relação aos dias de meditação que o Presidente Sánchez levou, para anunciar finalmente a sua decisão de continuar, o que não é, em minha opinião, o que se esperaria de uma força declaradamente soberanista. Esta apoiou de forma bastante enfática o Presidente e exigiu a sua continuidade, subscrevendo os argumentos que este apresentou para justificar a sua decisão, e agora vai-lhe ser difícil voltar atrás.

Compreendo que possam ter alguma simpatia por ele e concordar ideologicamente em muitas coisas, mas ele continua a ser o presidente de outra nação e de outro partido, e as questões que o afetam devem ser tratadas com um pouco mais de distância, ou seja, como assuntos externos de outro país, a não ser, claro, que considerem que, no fundo, pertencem à mesma nação, algo no que acredito cada vez mais. Uma força nacionalista nestas matérias deveria comportar-se mais na linha da Doutrina Estrada, no sentido em que deveria respeitar o que passa fora do seu espaço, manter uma certa distância e estar disposta a dialogar com quem governa lá fora. Deveriam ser relações entre povos, quaisquer que sejam os seus governos, e penso que tem de ser interiorizado por eles o de serem nações distintas, algo que não vejo acontecer no contexto atual. Receio que algumas forças nacionalistas não sejam assim tão nacionalistas e que o que pretendam realmente é participar nos debates e nas controvérsias que têm lugar na metrópole madrilenha.

O problema de se envolverem nos conflitos dos outros é o que está a acontecer neste momento. A renúncia "estratégica" ao poder é um velho estratagema político, já descrito nos manuais clássicos dos partidos políticos, como o de Michels, que o estudou como uma particularidade dos partidos socialistas. O dirigente ameaça quadros e militantes para que saiam a defende-lo, e suscitar sentimentos de apoio ao tempo que serve para se livrar de rivais internos. A novidade do caso, para além do facto de ser feito desde o poder é que agora o ultimato não se dirigia apenas ao seu partido, mas também aos seus parceiros de governo e aos seus apoiantes parlamentares, na sua maioria partidos nacionalistas. Com este estratagema, o presidente socialista está a demonstrar a sua falta de seriedade e o pouco respeito e consideração que tem pelos seus parceiros e pelos acordos a que chegou. Deveria ter cumprido primeiro e depois, se estiver cansado, demitir-se ou anunciar que o vai fazer, mas sem desgastar os seus parceiros, que podem pagar o duplo preço de os ter apoiado, renunciando aos seus princípios soberanistas, e agora de novo, quando se torna claro que não os tem em consideração e que, apesar disso, o apoiaram. Tudo isto no meio de um processo eleitoral na Catalunha com um resultado incerto que, sem dúvida, terá os seus efeitos. Se os nacionalistas que apoiaram o pacto se virem mais tarde incapazes de governar, ou muito enfraquecidos, penso que saberão quem culpar: aqueles que, abandonando os seus princípios e ignorando a sábia doutrina mexicana, quiseram envolver-se na governação de Espanha.

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